Cian. Charley Brindley

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Название Cian
Автор произведения Charley Brindley
Жанр Приключения: прочее
Серия
Издательство Приключения: прочее
Год выпуска 0
isbn 9788835410249



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de um corte de cabelo, sentava-se com o queixo em concha, quase sem piscar enquanto aproveitava cada sílaba. Magnalana MeCinco, uma garotinha adorável que, já tendo desfrutado de umas cem escovadas nos cabelos ruivos, parava Cian com perguntas a cada momento, assim como Rachel. Billy e Magnalana tinham a idade de Rachel e os três haviam se tornado grandes camaradas. Eles brincavam o dia inteiro do convés ao porão, onde encontraram esconderijos maravilhosos e muitas coisas curiosas entre a carga.

      Cian falava e eu, com correções ocasionais de Rachel, traduzíamos para Billy e Magnalana, que entendiam francês muito bem. Ela usava uma mistura de Yanomami e português, enquanto eu aliviava a história em língua francesa pelo bem das crianças.

      – Estava no meio da estação seca nas profundezas da floresta tropical – disse Cian enquanto cortava e penteava meu cabelo – quando a velha Miki-Leya estava ofegante nas margens verdes e quebradiças do rio Mãe. As piscadas de seus olhos foram ficando cada vez mais longas enquanto o sol ia se pondo na floresta, na margem oposta do canal de água verde e preta. O som de pássaros brigando levantou sua cabeça, e ela se esforçou para se concentrar nos galhos de uma andiroba morta, pendurada sobre o rio. Agora havia mais urubus do que antes, e um recém-chegado estava repreendendo e bicando seu irmão por um lugar no galho onde cravar suas garras e esperar.

      – O que são urubus, afinal? – perguntou Magnalana.

      – Urubus são pássaros – explicou Cian – que vêm comer a carne dos animais quando morrem.

      – Eles comem pessoas mortas também? – perguntou Rachel.

      – Sim, pessoas também.

      – Ei, espere um pouco – disse Magnalana – As pessoas morrem?

      Bem, essa era uma pergunta inesperada da garota. Obviamente, pelo tom de sua voz e expressão, ela não tinha sido informada acerca da finitude humana. É claro que ela tinha apenas nove anos de idade, então poderia ser que ninguém próximo a ela tivesse falecido ainda.

      Eu acho que a taxa de mortalidade na selva deve ser bem maior do que a que conhecemos, devido à falta de hospitais e organizações de apoio social, além de estar mais perto do limite da incerteza. Eu me perguntava como Cian lidaria com a questão. Ela responderia de maneira grosseira e prosaica como eu imaginava que faria a uma criança Yanomami, que provavelmente já havia testemunhado a morte muitas vezes, ou mostraria compaixão por uma menininha que pode ter levado uma vida protegida até esse ponto e pode não estar totalmente preparada para a ideia de perder a mãe ou o pai para a morte? Mas eu precisava ter me preocupado menos.

      – Na primavera —começou Cian – flores amarelas e vermelhas, como crianças, crescem a partir das sementes que seus pais plantaram amorosamente no solo próximo. A mãe e o pai assistem orgulhosamente seus filhos crescerem durante o verão, enquanto os protegem da melhor maneira possível do sol brilhante.

      As três crianças ouviram atentamente sem interromper.

      –Pouco antes do início da estação das chuvas, quando os filhos das flores crescem até a altura dos pais e estão prontos para fazer sementes e produzir suas próprias pequenas flores, o corpo dos pais retorna à terra. Feliz em saber que eles completaram suas tarefas aqui neste mundo, seus espíritos voam longe para estar com seus… – Cian hesitou e olhou para mim.

      – Deus? – eu perguntei.

      – Sim – ela disse – os espíritos voam para ficar com o Deus deles.

      – Você quer dizer – disse Magnalana e piscou antes de continuar – que mamãe e papai vão morrer?

      Antes que Cian pudesse dizer alguma coisa, Rachel respondeu por ela

      – Todo mundo morre. Mesmo nós, crianças.

      – Todo mundo morre?! – Magnalana exclamou – Mas que plano estúpido, quem pensou nisso?

      – E se nenhuma das flores morresse, como seria? – Cian perguntou – Ou suponha que todos os animais pudessem viver para sempre? Em breve, estaríamos todos cobertos por camadas e camadas de animais famintos, se mordendo em meio a pilhas de flores murchas. Por isso, Magnalana, todos os antigos devem morrer para dar espaço aos novos, como vocês três. – Ela acenou com o pente na direção das crianças —Em breve, vocês tomarão nossos lugares quando nossos espíritos retornarem à terra. A morte não é uma coisa ruim, é necessário que a terra tenha espaço para gerar nova vida e é por isso que precisamos que os urubus comam os mortos.

      – Mas que coisa feia para eles fazerem.

      – Feio, sim, mas você sabe, se ninguém aparecesse para comer todos os animais mortos, logo o chão da floresta seria coberto de corpos apodrecidos e ninguém ia querer morar lá.

      – Sua mãe e seu pai estão mortos? – Perguntou Magnalana.

      Nesse momento eu senti as mãos de Cian descansarem em meus ombros. Busquei com a minha mão as dela.

      – Sim – ela disse finalmente.

      – Então, onde você já plantou suas pequenas flores?

      As pontas dos dedos de Cian apertaram meus ombros, e eu sabia que ela estava sorrindo. Minhas flores vão florescer em breve, minha querida, muito em breve. Ela voltou a trabalhar no meu cabelo.

      – Miki-Leya é um gato? – perguntou Rachel.

      – Sim, um gato bem grande.

      – Que tipo de gato? – perguntou Magnalana.

      – Ela é chamada onça-pintada e é o maior e mais feroz animal da floresta tropical. Sua pele tem uma bela coleção de amarelos, marrons e pretos, de modo que, quando ela se deita perfeitamente imóvel, é possível dar um passo a poucos metros de distância e nunca a ver.

      – Mas os urubus a viram – disse Magnalana.

      – Os urubus podem sentir a morte a muitos quilômetros de distância, mesmo antes que a vítima tenha consciência de seu próprio fim.

      – E depois, o que aconteceu? – Rachel estava ansiosa para que Cian continuasse sua história.

      –À medida que a escuridão se aproximava de Miki-Leya, seu filhote veio, mas já não havia leite para ele.

      – Ah – Rachel e Magnalana disseram juntas.

      – Miki-Leya não comia há muitos dias, e seu leite estava agora seco. Fraca demais para caçar, e sem carne, nunca mais conseguiria produzir leite para o seu filhote.

      – O gatinho é amarelo, marrom e preto também? —perguntou Magnalana.

      – Não – disse Cian. Ele é escuro durante o dia como à meia-noite, assim como seu pai pantera.

      – Agora, onde está esse pai? – perguntou Rachel —Ele deveria estar lá para cuidar de sua família, os homens são sempre assim – disse ela a Magnalana.

      Magnalana assentiu vigorosamente em concordância, balançando os cachos vermelhos por toda parte.

      – As famílias de felinos selvagens são diferentes —disse Cian – Depois que o macho e a fêmea se acasalam, a fêmea afugenta o macho, ela prefere criar seus filhos sozinha. Miki-Leya sabia o que era melhor para o seu filhote, e se ela não tivesse ficado doente pela flecha do caçador que mordeu seu quadril, ela seria capaz de cuidar dele muito bem.

      – Provavelmente um caçador HOMEM – disse Magnalana com nojo enquanto ela e Rachel olhavam primeiro para o pobre Billy, depois para mim como se Billy e eu tivéssemos conspirado para atirar a flecha letal.

      Cian não comentou o sexo do caçador, apenas só continuou com sua história.

      –Miki-Leya fechou os olhos, querendo descansar por um momento, então ela invocaria alguma reserva de força escondida no fundo de sua alma felina e tentaria despertar, mesmo que para uma última caçada, apenas a fim de alimentar seu filhote novamente antes