A Revolução Portugueza: O 31 de Janeiro (Porto 1891). Abreu Francisco Jorge de

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Название A Revolução Portugueza: O 31 de Janeiro (Porto 1891)
Автор произведения Abreu Francisco Jorge de
Жанр Историческая литература
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estações de caminho de ferro, regressava a quarteis. Suspendiam-se por um mez as garantias em todo o districto do Porto e auctorisava-se a suspensão dos jornaes perigosos ali e no resto do paiz. Evidentemente, a sublevação não lograra exito e o sangue derramado na manhã de 31 servira apenas a registar uma infructifera tentativa de reacção contra a dynastia oppressora. A democracia fôra vencida pouco depois de ter vencido. A atmosphera voltava a carregar-se de violencia, de jugo tyrannico, e no horisonte já se descortinava que as represalias iam ser ferozes. Uma gazeta das mais populares da epoca, reconhecendo que, uma vez dominada a sargentada, o governo se apressaria sem duvida a esmagar a mais insignificante velleidade de resistencia, escrevia vinte e quatro horas apoz a derrota:

      «Á mercê do arbitrio é difficil poder-se viver; aguardemos melhores dias de liberdade e… calemo-nos.»

      Extincto o clarão redemptor, a imprensa – salvo raras excepções – ou vociferava tonitruante, enraivecida, contra os revoltosos, pedindo para os vencidos o maximo do castigo – até a pena de morte – ou se curvava resignada sob a ameaça do triumphador, disposta a supportar em silencio a desforra cruel que os vencedores procurariam abertamente tirar dos derrotados. O nucleo dirigente do partido republicano escrevia a poucas semanas dos acontecimentos:

      «O directorio cumpriu o seu dever, synthetisando as aspirações d'um partido; em vez de appellar para aventuras anarchicas, recommendou á imprensa republicana, aos conferentes e propagandistas a demonstração calma e justificada d'esses principios. (Alludia aos que tinham sido consignados no seu manifesto de 11 de janeiro de 1891).

      «Acceitando o mandato de acção, conferido pelo ultimo congresso, o directorio entendeu que consistia essa acção em repellir a mesquinha subserviencia que envolvia o partido em accordos com os grupos monarchicos e em conter as individualidades sem mandato, que, trabalhando sem disciplina, compromettiam o partido, como em seguida os acontecimentos o provaram.

      «As revoluções são factos inherentes ao organismo social; não é um grupo de homens que as fazem, como ou quando querem; mas compete a esse grupo dar-lhes pensamento e direcção quando sobrevenham.»

      Resumindo: o directorio entendia de boa politica não se responsabilisar pela tentativa mallograda e condemnava-a pelo que ella se lhe affigurava de desordenada e inopportuna. N'outra passagem do documento a que nos referimos affirmava que «a nação inteira julgara immediatamente o movimento de 31 de janeiro pela sua inopportunidade.» E no emtanto, a poucos dias da revolta, o mesmo directorio tinha espalhado profusamente esta opinião nitida e vigorosa:

      «No momento que atravessamos não ha logar para demonstrações theoricas nem para argumentar com os pedantocratas do constitucionalismo. Elles já deram as suas provas. Para a crise extrema um supremo remedio».

      Supremo remedio!.. Que outro poderia ser, afinal, senão o iniciado na manhã de 31?

      CAPITULO II

      O primeiro rebate do conflicto diplomatico anglo-portuguez

      Precisemos os factos:

      O ultimatum de 11 de janeiro de 1890 teve como pretexto a expedição do major Serpa Pinto na Africa Oriental. Antes d'ella já se falava vagamente na possibilidade d'um conflicto anglo-portuguez e porque em 1889, nos fins do reinado de D. Luiz, tudo o que dependia da influencia ou da acção ministerial se inclinava a hostilisar – ainda que mais ou menos disfarçadamente – a Inglaterra e as cousas inglezas.

      Parece assente que aquelle soberano, levado talvez por considerações de ordem familiar, projectava lançar-se e lançar ostensivamente o paiz nos braços do imperio allemão, quebrando todos os laços intimos que, desde seculos, uniam a nacionalidade portugueza á Grã-Bretanha. D. Luiz e os seus ministros queriam mais: queriam amarrar á Allemanha o destino do nosso commercio vinicola e das nossas colonias – o primeiro ligado á França e as segundas relacionadas quasi todas com o dominio inglez. Tentou-se mesmo fazer derivar da França para a Allemanha a exportação dos vinhos nacionaes, com a organisação em Berlim d'um certamen, que, no fim de contas, nada deu de productivo.

      Mas o primeiro rebate d'essa hostilidade appareceu de fórma inilludivel em julho de 1889, quando o governo então no poder rescindiu o contracto de 14 de dezembro de 1883 (o contracto para a construcção do caminho de ferro de Lourenço Marques). Não diremos em absoluto que essa rescisão fosse apenas inspirada no desejo de ferir homens e interesses da Grã-Bretanha. A verdade, porém, é que muita gente quiz vêr logo no facto o ensejo propicio para o trespasse da mencionada concessão a um grupo de capitalistas allemães e essa suspeita surgiu clara e precisa na imprensa a mais ponderada e suave de termos. A Inglaterra, pela bocca dos seus orgãos jornalisticos, sentiu-se fundamente attingida com a medida tomada pelo governo portuguez e não tardou que désse largas a uma celeuma até certo ponto exagerada, mas comprehensivel em face das nossas manobras secretas com a chancellaria germanica.

      Os periodicos londrinos aconselharam acto continuo o governo inglez a enviar a Lourenço Marques uma esquadra, com o fim, diziam ironicamente, de «proteger os seus subditos ali ameaçados pela valentia de Portugal», e embora um ou outro d'esses mesmos periodicos indicasse vagamente a arbitragem como um meio decente de liquidar o assumpto, o conjuncto d'elles não desafinava na sua exigencia de que deviamos soffrer uma punição significativa. Por alguns dias receiou-se, effectivamente, que o governo inglez seguisse o conselho da imprensa exaltada. Mas, como ainda não soara a hora para a diplomacia britannica nos mostrar que andavamos por caminho errado, pretendendo, nos pactos de alliança internacional, substituil-a pela Allemanha, as cousas foram atamancadas sem grande dispendio de dignidade e as nuvens negras, que já carregavam e entenebreciam o horisonte, perderam um pouco do seu aspecto ameaçador.

      O partido republicano, tendo seguido com interesse patriotico a marcha dos incidentes, não duvidou estigmatisar publicamente o projecto desvairado da monarchia ao procurar enredar a nacionalidade na teia emmaranhada d'um conflicto diplomatico. Os jornaes da epoca falam pormenorisadamente da campanha que esse partido então fez não só contra a projectada alliança luso-germanica mas, principalmente, contra a entrega do caminho de ferro de Lourenço Marques a um grupo allemão.

      Quando surdiu o ultimatum, ninguem hesitou em reconhecer que, se a patada do colosso de além Mancha era brutal, mesmo brutalissima, á monarchia e aos seus governos cabiam, entretanto, uma boa parte das culpas. Opinião identica expressou-a mais tarde João Chagas ao tratar do assumpto, de collaboração com o ex-tenente Coelho:

      «Estava-se em principios de janeiro sob uma situação presidida pelo sr. José Luciano de Castro e na qual detinha a pasta dos estrangeiros o sr. Henrique de Barros Gomes, quando os jornaes começaram referindo-se com insistencia á possibilidade d'um conflicto com a Inglaterra, a proposito das pretenções d'esta nação sobre os territorios do Nyassa, onde algumas expedições portuguezas de caracter scientifico operavam ao tempo. O facto pareceu novo e surprehendeu, se bem que tivesse origem antiga no plano de absorpção da Africa Austral e dos territorios sertanejos de Moçambique, principiado a executar-se em 1888, pelo tratado feito entre a Inglaterra e o potentado Lobengula no qual era comprehendido o territorio dos Mashonas, reivindicado por Portugal; e levado a cabo pelo tratado de 18 de maio de 1891, extorquido pelo governo britannico á invalidez portugueza.

      «O litigio, que veiu a liquidar-se desastrosamente pelo ultimatum de 11 de junho de 1890, pode dizer-se, começou então. Durante dois annos – forçoso é reconhecer para esclarecimento da historia e apuramento de responsabilidades – a Inglaterra oppôz ás pretenções de Portugal o veto mais formal. Já em 1887, o marquez de Salisbury protestava contra os tratados, assignados e publicados, de Portugal com a Allemanha e a França, declarando não nos reconhecer o direito, que aquellas nações nos attribuiam, de exercermos jurisdicção em territorios d'Africa, onde não tinhamos occupação effectiva, e invocava, para justificar o seu protesto, as decisões da conferencia de Berlim.

      «Mais tarde, em 1888, sir James Fergusson pronunciava na Camara dos Communs um discurso que fez impressão em Portugal, mas nem por isso deixou de constituir uma negação severa, que o governo britannico officialmente apoiou, dos direitos de soberania, invocados pelo governo portuguez, sobre o sertão da Africa Oriental. Quando, apoz o tratado feito pela Inglaterra com o regulo Lobengulo, o governo