ENtidades. Diego Maenza

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Название ENtidades
Автор произведения Diego Maenza
Жанр Ужасы и Мистика
Серия
Издательство Ужасы и Мистика
Год выпуска 0
isbn 9788835416906



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      ENtidades

      Diego Maenza

      Tradução de Octavio B. Junior

      Título original em espanhol:

      ENtidades

      © Diego Maenza, 2021

      © Tradução de Octavio B. Junior

      © Tektime, 2021

      www.traduzionelibri.it

      www.diegomaenza.com

      ÍNDICE

       História familiar

       O sapo que foi poeta

       A caverna

       O homem diante do espelho

       Madrugada

       Devaneios

       Os monstros interiores (ou fábula de um ato)

       Caminhada noturna

       O avarento

       Formigas

      História familiar

      A vida toda tenho padecido por meu aspecto físico. É uma maldição que tenho tolerado desde minha infância e pela qual vivo com tanta vergonha que foram poucas as vezes que saí de minha toca.

      Tenho medo que as pessoas me olhem. Conservo pavor. Fico trêmulo. Algum médico benevolente me diagnosticou com o mal de agorafobia, mas pude compreender que esse leve estrago era apenas cócega comparado com meu padecimento. Não suporto o olhar das pessoas. Me estigmatiza.

      Devido às minhas deformidades, passei a ser a vergonha da família, e a eles se deve à calamidade de meus traumas mais profundos. Reitero: sou a vergonha de minha família. Sou a ovelha negra de minha árvore genealógica, não por meus atos, mas por ser quem sou.

      Para que tenham uma ideia, meus braços são desproporcionais com relação ao meu corpo, pois não estão na altura que se considera normal. Minha cabeça é demasiada grande. Ai! A cavidade craniana do meu pai era perfeita! Era o orgulho em seu trabalho, pois, por ter sido uma figura pública muito reconhecida em quase toda a nação, as mulheres lhe contemplavam e se maravilhavam, ficavam loucas ante a presença de meu pai. O efeito que causava dentro delas era quase devastador; não é exagero afirmar que quando viam meu papai, na hora, seus pelos se arrepiavam, abraçavam mais seus maridos, bajulando-os e disfarçando, e gemiam em silêncio.

      Nasci pobre de pelo. Mesmo assim minha mãe me amava. Uma mãe sempre amará seus filhos, por mais deformes que eles sejam. Me enoja ter uma cabeleira tão mesquinha. A juba da minha mãe, por outro lado, era generosa, espessa como uma selva intocada, e ela a exibia sem pudor cada fim de semana no compasso do ritmo de alguma música de cabaré. Sempre ganhou aplausos sinceros do público masculino que debruçava seus olhares ante os movimentos sensuais de minha mãe. A pelagem da minha franja é insípida. E me dói não ter herdado os maravilhosos fios de cabelo de minha progenitora.

      Nunca conheci minha avó, mas minha mãe sempre me disse que ela tinha um olhar especial, apaixonado e hipnótico. Como se narrasse alguma lenda proibida, me dizia sussurrando em segredo que não existia um homem que resistisse ao olhar imponente da vovó. Sobre o vovô, por outro lado, me relatava em alto e bom som histórias fascinantes sobre os prodígios artesanais que realizava com seus braços dos sonhos. Era um artista gabaritado.

      Em algumas ocasiões estive apaixonado, várias vezes de forma dobrada, mas minhas insinuações mutiladas jamais foram decifradas, e aquelas lindas garotas que pretendi jamais repararam em mim devido às minha desconfiguração.

      Tenho tios e primos que nasceram com seus órgãos na posição adequada. Nenhum com as minhas carências.

      Vejo com nostalgia e orgulho o álbum familiar. A foto do meu pai no circo Birdmink, com uma linda cabeça minúscula carente de cabelo, com seus fios finos e dourados como um sol nascente adornando seu microcéfalo e suas pestanas albinas de bebe neonato. Por pouco não nasci totalmente calvo. Lindo igual, não existirá nenhum. A foto da minha mãe, com sua pele coberta de finos pelos castanhos, seu pescoço de leonina matriarca e seus braços lanudos de coelho angorá. O fotógrafo a capturou em seu melhor momento, o mais radiante, quando todo o pelo corporal cobria sua anatomia sem permitir que ninguém ofuscasse suas luminosas noites de espetáculo como mulher loba. Estou em êxtase com a foto do meu avô. Se estivesse viva, me abraçaria com suas extremidades superiores de quinze centímetros e seus dedos minúsculos transformados em membros mutilados. E sei que o faria, apesar de sentir-se envergonhado ao contemplar meus braços que conservam a perfeita proporção de Vitrúvio. Minha avó, com seu único olho da frente, derramaria um fio de lágrima se houvesse me conhecido ao nascer, ao reparar em meus dois olhos cor de avelã perfeitamente alinhados em meu rosto. Minha mãe me amaria para sempre, apesar deu portar essa asquerosa pele lisa.

      Nasci assim, disforme, e não sabe a vergonha que sinto. Quando meus pais morreram e completei quinze anos, o homem elefante e a mulher barbuda me exilaram do circo, alegando que não tinha nada de especial, que não portava nenhuma virtude que justificasse minha permanência junto a eles, porque a medida que crescia me parecia cada vez mais a um comum espectador. Ao ser expulso da tenda, me resignei na compreensão de que jamais conquistaria o coração duplo das siamesas. Aquela certeza é o mais abominável de minha condição. Sim, sou um monstro e isso me queima. É a maldição que deverei suportar até o último dos meus dias.

      O sapo que foi poeta

      e, no entanto, te amo, sapo

      como amava as rosas temporárias essa mulher de Lesbos

      porém mais e teu cheiro é mais belo porque posso senti-lo

      Juan Gelman, Lamento por el sapo de stanley hook

      Nunca foi um segredo para ninguém que o Sapo, desde muito pouca idade, amava frequentar as lagoas. Quando era apenas um infante, Sapo descobriu um prazer indescritível ao sentir-se salpicado de lama. Era algo que o fazia sentir-se único, especial, diferente, empoderado, sobre tudo ao se dar conta de que as mães dos demais garotos não permitiam às suas proles essas licenças de entretenimento imundo dos banhos pantanosos. De modo que Sapo, quando regressava a sua casa do pântano, manchado com um lodo seco e restos de vitórias-régias sobre um único macacão à vista de seus púberes amigos, era como um herói anônimo que retornava de sua luta contra a encarnação do mal. Os meninos guardavam uma admiração secreta por ele. Mas não era assim para suas mães, para as quais Sapo representava a personificação da imundícia e o desamparo. Mantinham um asco ou temor, disfarçado, claramente, de um suposto olhar de compaixão.

      Apesar de tudo, os garotos sempre se mostraram atenciosos com ele, e quando notavam que Sapo perambulava, com intenção de integrar-se às suas atividades recreativas, os rapazes gozavam da confusão que era contar com sua amizade. Dessa forma, no dia seguinte teriam um tema importantíssimo para conversar ao entrar no liceu. Lhe atiravam a bola de pano e, como sempre, Sapo a pegava com seu robusto saco vocal que lhe obrigava a emitir um sonoro croac. Quando jogava bola, Sapo sempre ia de goleiro, pois suas pernas poderosas lhe permitiam dar o impulso necessário para guiar seu pesado corpo até o lado da esférica e defendê-la com seus dedos esticados. Então Sapo exibia um sorriso de complacência e felicidade, e os meninos o premiavam com alguns insetos viscosos que, de maneira clandestina, coletavam para ele com paciência e amor. Ah, que bela era a vida! Até que as mães do bairro colocassem suas cabeças descabeladas pelas janelas de cada casa, enquanto umas esfregavam os pratos, e outras lavavam as roupas, e gritavam o nome de seus filhos para que acudissem a seus chamados, e, obviamente, para que se afastassem da perniciosa presença do Sapo, que poderia transmitir-lhes (assim afirmavam enquanto puxavam seus filhos para dentro de seus lares) enfermidades como a perna vermelha, quitridiomicose, neoplasia, papiloma ou Salmonella. Então Sapo ficava sozinho e de salto em salto chegava ao seu único refúgio, que lhe permitia escapar do tangível da